30.6.20

A GAffe enredada

Karen Elson

A Gaffe considera que as únicas redes que se podem usar são aquelas que protegem uma mulher da indiferença dos homens.

26.6.20

A Gaffe de coração entediado



A Gaffe tem sentido o coração tão idiota, tão inútil, tão aborrecido e maçador, tão entediante e tão pateta como se estivesse permanentemente pasmado a olhar a passarada digital sem qualquer vontade de reagir à cíclica maquineta que a desenha.

A Gaffe sabe, pois que é uma rapariga esperta, que é inútil tentar evitar que lhe desmantelem o coração. Sente-o como o descrito, porque por norma se encarrega de o destroçar sozinha.

25.6.20

A Gaffe sinfónica



Perguntaram à Gaffe, assim, sem mais nem menos, de repente, de chofre, sem contar, de embate, de colisão e à falsa fé, qual é a sua escolha musical para fazer sexo.

Como seria de esperar, olhou de soslaio para a ousadia e pensou seriamente que se prontificavam a fazer gracinhas com pífaros, pandeiretas, flautas e flautins, órgãos de tubo, harpas e oboés, mas o músico era um rapagão com um melífluo ar inocente capaz de lhe escrever todas as pautas que quisesse. Não lhe pareceu capaz de arriscar ouvir a resposta mais grosseira que incluiria a qualidade da batuta do maestro.


É evidente que uma rapariga esperta, no caso inquirido, constrói a sua própria melodia e não descura as mais repetitivas ou as menos elaboradas, as de ritmo pobre e mesmo as em dó menor. Tudo depende da interpretação da orquestra. 

Seja como for, mesmo que saibamos que tudo o que temos é semi-colcheia, devemos sempre exigir que se ouça Wagner.

As sinfonias todas.




24.6.20

A Gaffe muito irresponsável



É impressionante verificar como a teoria culpabilizante do vivemos acima das nossas possibilidades, entranhada e transformada num reflexo pavloviano, se transforma de repente na de novo culpabilizante somos uns irresponsáveis e destruímos o milagre portuguêsquando os números de infectados pelo vírus pandémico cresce ao ponto de colocar este recanto que albergará a Champions League - em estrangeiro, para provar que somos cosmopolitas e não apenas um aglomerado de parolos, provincianos e deslumbrados que apanha com sofreguidão os caídos europeus com a rejubilo dos indigentes - num lugar cimeiro na lista dos países mais doentes. 

A ausência de respeito pela lógica, a constante ambiguidade, as duplas, triplas e contraditórias posições e opiniões e imposições dos meninos e das meninas - bom dia, Graça Freitas! -, que nos governam e que, diz o povo, dão uma no cravo, outra na ferradura, incriminando e penalizando desagradáveis bebedeiras juvenis e públicas pelo disparar da Covid-19, mas admitindo em cerimónias solenes, pomposas e inúteis, comemorações, aglomerações de populismos, eventos que mais avante podem descambar em descalabro sanitário, geram inevitavelmente o descrédito que implica a muito curto prazo um relaxamento comportamental daqueles que por norma e regra, adrenalina, testosterona e exaltação hormonal – tudo junto e mais que já não sei, que já sou velha -, não são fáceis de confinar e que costumam ser adversos a recomendações e ralhetes de quem não tem de correr para o trabalho nos transportes públicos apinhados e racionados. 

A irresponsabilidade dos que destroem o milagre português relativo à Covid-19, tem clara ligação com a quebra de autoridade moral dos que dirigem administrativamente a máquina de resposta à pandemia. Ninguém consegue, por exemplo, ouvir Graça Freitas a considerar a UEFA e a FPF interlocutoras privilegiadas neste caso de saúde pública, sem ter de admitir a possibilidade de estarmos a um passinho de assistirmos à entrega da taça dos ventiladores esgotados aos profissionais de saúde premiados. Ninguém consegue, por exemplo, ouvir o destemor de Marta que sem pudor reporta a benignidade de multidões bem controladas desde que um ministro, ou um sindicato qualquer, ou umas orações distanciadas, ou um cruzeiro carregado de turistas, surjam em primeiro plano. Ninguém acredita já num Presidente que se refere ao heroísmo, a responsabilidade, à resiliência, à capacidade de sacrifício - e tudo o resto que de bom somos nós fartos - de um país que é ninho da melhor gente do mundo e um exemplo mundial de como se enfiam pessoas num autocarro suburbano esperando-se que resistem estoicamente - gente e autocarro - à doença e à ferrugem. 

O milagre português, assim como as nossas possibilidades mal avaliadas, são construções alheias. Não nos pertencem. São manipulações insidiosas com que nos fecham os olhos e nos tapam as bocas, provavelmente para que, irresponsáveis, não sejamos infectados pela verdade.

23.6.20

A Gaffe e Moby Dick


Uma rapariga esperta gosta de sonhar com valorosos marinheiros perdidos nos ventos desastrosos da sorte, arrogantemente desafiadores do perigo e de olhos repletos de enigmas, dignos descendentes do destemido herói de Herman Melville.

Nem todos correspondem a estes parâmetros de exigência, mas os sonhos das raparigas podem ser implacáveis e corroer com facilidade a corda que prende os homens à ilusão de as ter.


Apesar de tudo, somos condescendentes. Não exigimos um universo romanesco formado por ventos sem bússola, mastros de absoluta segurança e velas desfraldadas a desfazer as nuvens, mas recordem rapazes que convidar-nos para jantar e passar a noite a falar das quedas da bolsa ou de remates falhados nos intestinos das finanças, não vos vai ajudar em nada a navegar, mesmo à bolina.


Procurem trazer no olhar o cintilar capaz de esmorecer a luz das velas e tenham consciência que a crueldade bolsista, ou a das bolsas do quotidiano cru, vos vai apagando a chama da aventura - mesmo a da ilusão -, mais tonta e pateta ou mais ousada e destemida, mas essencial para iluminar faróis.

22.6.20

A Gaffe suspeita

Billydeee

A Gaffe suspeita que a melhor forma de fazer com que uma pessoa deixe na nossa memória uma marca indelével, é tentar desesperadamente esquecê-la.

A Gaffe campeã

Roberto Bompiani - Mrs Butterfield

A Gaffe aconselha os seus amores, antes que todas as estátuas fiquem borradas, a que se vá - caso se saiba ler e escrever -, ao Google pesquisar o nome do esculpido a esbardalhar com tinta. Às vezes é giro, poupa-se em vergonha alheia e evita-se pensar que este entretenimento tão em voga também prova que a imbecilidade pindérica e a parola idiotice grassam em todo o lado, não atingindo apenas as nossas altas individualidades que emporcalham a inteligência mais comum com anúncios miseráveis de vendas a retalho e aluguer de cidades ao campeonato do populismo - ganhando o segundo pior rácio de novas infeções por Sars-CoV-2 por cada 100 mil habitantes entre os 10 países europeus com mais contágios -, como se tudo não passasse de uma questão de gases depois da feijoada nas pontes das raves.

20.6.20

A Gaffe está por tudo



No centro do Caos, seja ele qual for, é necessário termos a noção da Ordem a ele subjacente.
Nesse processo, a elegância cumpre uma das suas mais importantes funções: evitar o inconveniente de nos despentearmos.   
  

19.6.20

A Gaffe mascarada

A Gaffe tem recolhido por todas as esquinas desta gente tão didáctica, tutoriais relativos à confecção das máscaras ditas comunitárias. 
As self-made máscaras que, para além de fazer pendant com o outfit de cada dia que passa, podem contribuir para a salvação do planeta, porque as encontramos também na versão reciclada. 

A Gaffe não pode nem quer deixar passar a oportunidade de homenagear os heróis e as heroínas que dedicam o seu precioso tempo a confecionar estas porcarias grossas, porosas e estampadas e as oferecem às Juntas de Freguesias para que sejam disseminadas pela população, qual vírus assanhado.

É de sublinhar a oportunidade de reciclar peças de vestuário a que já não damos muito uso, pese embora haja a tendência para as usar como saídas de praia. Tendo em conta que para se sair da praia é conveniente ter lá entrado, não nos faltarão por utilizar as peças referidas.
 

É evidente que o talento para bem costurar não é apanágio de todos, nem essencial à humanidade de que alguns fazem parte, mas a quem cose por gosto, não se olha o dente.


Os acabamentos em fita de nastro, principalmente os vivinhos, podem ser substituídos pelas fitas académicas que ficam sempre bem e dão algum status, sobretudo se forem amarelas e não permitirem multiplicações, nomeadamente as católicas.

 
Antes que se esqueça, a Gaffe recomenda que, apesar de toda a nossa boa vontade, se deve escolher com imenso cuidado as peças que vamos usar para o fabrico caseiro dos nossos belíssimos adereços. Há casos em que o uso presente não difere por aí além do uso passado, mas é sempre aconselhável acautelar as falhas.



18.6.20

A Gaffe escancarada

Foto de William Helburn

A Gaffe pode abandonar os apetrechos caríssimos que usou ultimamente para dar uma vista de olhos distantes nos rapagões que se vão despindo ao som das ondas de calor que chegam dengosas aos semáforos à beira-mar plantados.

Aberto, escancarado, descerrado, o melhor país do mundo não permite que as visitas sejam infectadas, apresentando a todos os pingados e descarregados gatos que chegam nos cruzeiros - onde, pela graça do senhor e da DGS, ninguém é esmagado por gente amontoada, pois que um paquete tem classe executiva, não sendo, portanto, um transporte público -, um diploma que confere ao terreno o rótulo Limpo e Seguro. Portugal é, uma nação limpa, segura e valente, preparadíssima para enfrentar os descalabros que se anunciam, levantando hoje de novo o esplendor do que era bom.

Dando crédito a um esquálido e esquelético Marcelo - emagrecido à míngua de apertos e açucares -, o melhor país do mundo e a melhor gente do planeta, pode acolher de imediato tresvarios vários com a aquiescência de Graça Freitas que, abertas as lojas, parece suplicar que lhe desamparem a dela.

A Gaffe sabe - por fonte próxima lho ter confidenciado -, que mesmo a Directora Geral de Saúde se prepara para abrir o seu closet ao turismo sénior - regime de meia pensão - com descontos significativos a quem reserve os fins-de-semana para visita à secção das pregadeiras, dos alfinetes de peito e dos broches, vá.

A Gaffe não é de todo adversa ao escancarar descontrolado dos aeroportos, gares, apeadeiros, cais, colinas e fronteiras, desde que, meus amores, não se animem as hostes descaradas com a graçola imbecil do regresso à normalidade que se faz tarde e um casaquinho de malha é quanto basta nas nossas noites de aragens mais frescas ou nas costas deste país que de seguro tem perigosamente muito pouco.


16.6.20

A Gaffe na Disneyland


A inutilidade deste assunto atinge tamanho nível que acaba por ser fascinante debruçarmo-nos sobre esta recolha de informação capaz de abalar todas as nossas certezas e enraizados conceitos, sobretudo os mais imbecis. A nossa capacidade e quase obsessiva tendência para retirarmos ilações, certezas e conclusões de minudências inúteis é de tal forma generalizada que acabamos sempre por acreditar que um charuto jamais será apenas um charuto.




15.6.20

A Gaffe envelhece

Casa

À sombra dos teixos olho as hortênsias abertas aniladas. Moldaram-nas, modelaram-nas. São esferas pousadas num tapete macio de relva primorosamente escanhoado. Não há anomalias naquela gigantesca explosão controlada.
No chão, no verde húmido e uniforme, oscila no entanto uma minúscula flor amarela, rasa, inútil, transgressora, esquecida pela sanha perfeccionista do homem que trata do jardim.

De súbito, tudo é engolido pelo amarelo inadmissível. A planura da relva, as hortênsias, os teixos, a casa, o céu, o rio e os socalcos.

A minúscula flor improvável absorve as paisagens que trago dentro, da mesma forma que dilui o que vejo. Nada há a não ser aquele ínfimo tom a oscilar no vazio.

É como uma desilusão.

São estas insignificantes flores imprevisíveis que anulam as braçadas, os ramos, os bouquets que tínhamos escolhido para adornar os dias. Passamos a olhar apenas a pequena anomalia.

É nesse instante que envelhecemos.

13.6.20

A Gaffe rabiscada



Raramente faço rascunhos.

Mas nos rascunhos que faço, fica sempre o que de mais feliz encontro. Depois rasgo tudo. Apago. Tenho medo que, ao ver escrito o que me torna mais completa, fique a desejar ser mais perfeita e a perfeição magoa.

Por isso é sempre de imperfeita rajada que vos falo. 


12.6.20

A Gaffe e uma dúvida


Para que servem os dias de chuva, em que o cinzento brando de uma espera se torna um clássico que finda por nos enfraquecer a vontade de olhar a luz coada e esvaecida que tomba dos telhados, senão para esquecer que em todas as ruas existe um instante em que é essencial sentir que a luminosidade plena dos dias solares pode estar debruçada no parapeito do peito de quem nos cruzamos, ou que por nós espera quando não olhamos?

11.6.20

A Gaffe do líder


O facto das medusas sobreviverem sem cérebro há mais de 650 milhões de anos, não augura nada de bom.

10.6.20

A Gaffe papável



Por iliteracia, por profunda e vergonhosa incultura, por inépcia declarada e por falta escabrosa de estudo e de paciência, a Gaffe sempre considerou sobrevalorizada a obra de Tolentino de Mendonça. 

Um pecado que esta rapariga nunca se cansa de cometer, até porque o cardeal foi escolhido pelo beato Marcelo para liderar o 10 de Junho do ano da Graça - uma querida - de 2020 por exactamente ser um ilustríssimo e nobilíssimo poeta, digno de Camões e de tantos mais. Outra razão qualquer seria de um deslumbramento parolo e pindérico confrangedor.

Esta renegada iletrada enfia o poeta, o ensaísta, o doutor, o príncipe da Igreja, o erudito, o presidente das comemorações do dia de Portugal e de Camões - e mais que não se diz, porque não se sabe -, mesmo ao fundo das vielas esconsas da biblioteca, logo atrás dos mais caseirinhos, maçadores e doentios poetas e mesmo ao lado dos Grandes Chatos - uma corrente que sobrevive ao tempo e que floresce amiúde.

Tolentino de Mendonça é um digníssimo representante deste grupo bafejado por musas mais ou menos moncosas e ligeiramente sebáceas, fortemente céreas e cerúleas, encaixando no nicho que ninguém consegue ler sem bruxulear de tédio, mas que de súbito, por acasos e ocasos de orações, se torna importante dizer que veneramos e que consideramos um marco na história da literatura universal.

É evidente que os escritos de Tolentino de Mendonça estão agora mais rubros com a adição do cardinal do barrete, mas aos olhos desta imbecil, despudorada e bruta rapariga, vestes e obra surgem escorregadias, untosas, ligeiramente viscosas e amareladas como gente constipada. Talvez porque Tolentino é amanteigado. Talvez porque Tolentino lhe pareça demasiado santo, demasiado papável, demasiado turificado, demasiado inchado pelo peso desmesurado dos poderosos segredos vaticanos que vai embuchando, ele que sempre pareceu um homem de pequenos segredinhos.

Injusta, esta rapariga tonta, com certeza, e paradoxal, posto que, depois desta exposta colecção de impropérios, reconhece que Sua Eminência é um dos mais brilhantes, extraordinários, esclarecidos e cultos intelectos com que fomos abençoados e que será sem sombra de dúvida um magnífico papa. 

É facílimo descoagular a benignidade santa daqueles que se escapam à sina de pecado dos mortais que sorvem de um trago as borras de um café torrado nos infernos. Difícil é aceitar a pureza pia de enjoativas natas servidas em porcelana glorificada pelas cores papais.

9.6.20

A Gaffe manifestante


Convém recordar, meus amores, que poder ficar fechado em casa com medo dos mauzões dos vírus que grassam lá fora, evitando desta forma aglomerados de prováveis infectados que se manifestam a favor de qualquer inconveniente relacionado com Direitos Humanos, é também prova de que se é um privilegiado.

Da mesma forma, é forçoso relembrar que aqueles que permanecem neutros, ou em silêncio, perante uma injustiça, estão inevitavelmente ao lado daqueles que a cometem.

8.6.20

A Gaffe dos oceanos




A Gaffe não quer de todo deixar passar pela onda o Dia dos Oceanos, sobretudo quando é presumível que nos molhemos com mais uma crista de imbecilidade histérica que condena manifestações em nome dos Direitos Humanos a favor de uma normalidade que só em casos raríssimos – de cem em cem anos, quando o rei faz anos e as galinhas tossem -, protegeu ou protegerá os mais vulneráveis. 

O vírus, meus amores, não pode servir para que em nome da saúde seja de quem for, se torne aconselhável, ou decretado, ou permitido, ou assinado, ou determinado pelo arco da governação do medo, silenciar a revolta contra os atentados ao que deve ser intrínseco à humanidade. 

Se admitirmos em nome da saúde da avozinha, deixar passar incólume o que é desumano - ou adiar a indignação para calendas mais morninhas e resguardadas -, nem avó merecemos ter e, meu queridos, é bom que se refira que a senhora corre mais riscos numa Lisboa e Vale do Tejo repletos de miseráveis condições de trabalho que facilitam a propagação da doença, do que no meio de gente protegida e devidamente asséptica que sabe o que deve fazer num mergulho esgotado na praia do Marcelo.

Então vá. Parabéns oceanos!


6.6.20

A Gaffe da onça


A Gaffe não condena o adultério.
É ele que mantém muitos casamentos vivos e tendo em conta que um homem é só fiel na maior parte dos casos por preguiça, tenhamos, nós raparigas espertas, como um dos lemas do nosso trajecto relacional, a máxima que nos diz que apenas no caso de encontrarmos o homem da nossa vida, se deve pedir o divórcio, ou quebrar a ligação que nos parece estável no momento.

Até lá, brindemos com a nossa aliança eterna, enquanto dura, e sejamos felizes, pelo menos até o nosso amante nos trocar ou, então, trocarmos nós de amante, caso a rotina nos estiver a dar cabo do casamento, ou da interminável relação.

Convenhamos que faz imenso falta termos sempre alguém de reserva no cacifo, alguém que  nos possa mudar os pneus, ou nos compre as especiarias que esquecemos no hipermercado.
Depois, sejamos sinceras, apesar de tudo é bem mais agradável uma cama aquecida por um bichinho com pêlo que não se move a pilhas, do que esperar por um Godot qualquer num leito virginal cujas únicas bolinhas que alberga são as de naftalina.

Quando Godot chegar, e se chegar, encontra-nos quentinhas!

5.6.20

A Gaffe de esperanças



- Estou grávida outra vez! Tão bom! Eu bem sentia que havia qualquer coisa no ar.
- As tuas pernas. 
Mana

4.6.20

A Gaffe macabra

Christer Strömholm - 1954

Cruzou a perna e acendeu o cigarro. Uma Sharon Stone de pacotilha, com muito menos pernas e muito mais lingerie.
- Podes confiar em mim. Eu sou um túmulo.

É sempre útil termos à nossa disposição um túmulo capaz. Nunca se sabe se algum dia nos veremos na necessidade de estrangular uma sensação ou assassinar um sentimento. 

Mas a minha Sharon Stone é um túmulo sem tampa. Os cadáveres ficam a apodrecer à vista de toda a gente.

A Gaffe metafórica

Make America Great Again

3.6.20

A Gaffe das etiquetas


A única etiqueta passível de se prender à alma é aquela que é capaz de nos indicar o modo de nos tornarmos únicos sem sermos diferentes.

2.6.20

A Gaffe recuperada


Recuperemos a rua e os seus ocupantes, pois que é nesta reconquista que se encontra também a certeza da importância da futilidade para a nossa saúde mental.
Paremos para olhar a imagem texturada de um homem que aliou com uma subtileza admirável o allure vintage a uma invejável e actualíssima urbanidade.

São as texturas escolhidas - os alinhados, a camurça, o algodão -, as cores e o xadrez usados no casaco, a transformação maravilhosa da camisa justa, o corte das calças de cintura subida e cinto largo de couro espesso - muito partisan -, que deixam visíveis os sapatos de camurça usados sem meias, que tornam este rapagão num dos passeantes mais bem vestidos da Avenida.

Não basta a César ser sério, deve também parecer que saiu pela porta principal do coliseu do bom-gosto.

1.6.20

A Gaffe cinzentona


A Gaffe sabe que nos dias que correm, deprimidos, confinados e apertados por máscaras alheias à nossa vontade, vivendo abaixo das nossas possibilidades e permitindo de modo absurdo que alguns continuem ainda a viver acima das deles, a tendência é enrolarmo-nos nas carpetes de outrora que ainda nos recordam os tempo em que as vacas eram gordas e pastavam livres e unidas - agora sofrem de distúrbios alimentares e são obrigadas a guardar distanciamentos.

Mas nem tudo vos é permitido. Nem a pandemia, nem a falta que faz o Príncipe de Gales no vosso armário, vos ilibam das tontices floridas que, com certeza, alegram muita gente - sobretudo nos lugares, digamos, mais polivalentes, ambivalentes, ambidextros, ou como se queira.

A não ser que detenham um allure facial ameaçador, a Gaffe aconselha vivamente a que não tenteis vestir os cortinados ou as camilhas das vossas santas avós. As senhoras não iriam gostar e o vosso dia passaria a sofrer de artroses na coluna de tanto se ver obrigado a vergar os cinzentos mais preconceituosos.