10.10.24

A Gaffe na urgência


Dizem os monges que o nascimento de uma criança prova que Buda continua a acreditar em nós.

Festejemos pois cada instante que vivemos.

Na dor, se for completa, germina a sobrevivência. Às tempestades resiste o sopro ténue dos que recomeçam. O confronto com os desertos acorda-nos a força de uma gota de água e o cyclamen, a violeta brava, a árvore das camélias, florescem em pleno Inverno.

É urgente emudecer os que como macacos enjaulados atiram colheradas de dejectos, de azedume, de secura e de amargura, de desapontamento torpe e derrotista, da janela de um segundo andar escuro e incontornável aos transeuntes a quem ganharam rancor.
É urgente calar os velhos que não são o do Restelo, porque o do Restelo é muito mais do que as amarras que o fizeram, mas os velhos que nos cospem a acidez do ressentimento gratuito e sem motivo que não resida apenas na derrota, que corrói até o sonho de nos vermos a sonhar.
É urgente desacreditar a moralidade de cabelo emproado e laca na bondadezinha que esconde dentro do missal estampas pornográficas e exibe nos dedos pios a solidariedade da indiferença denunciada por um discurso cliché.
É urgente festejar a mais ínfima alegria, a mais banal das pequenas coisas, a mais despercebida forma de se ser feliz, mesmo com lágrimas.
É urgente festejar cada minuto, cada instante, cada pedaço de tempo que vivemos.
É urgente agarrar a vida sem a inevitabilidade fadista dos profetas da derrota.
É urgente cobrir a alma com as cores que quisermos e fazer dela bandeira desfraldada para os outros.
É urgente festejar os dias.
É urgente celebrar todas as datas.
É urgente acreditar que a cada instante nascemos e que cada minuto que chega é a prova que merecemos que alguém acredite em nós.

É urgente ser optimista. Há tanto tempo para se morrer depois!