O amanhecer no Douro é sempre lento e frio. Um ar áspero, pedregoso e azulado, que rasteja e trepa às árvores, alterando as copas, substituindo-as. As horas do cedo das manhãs do Douro são as que sussurram a lentidão dos bichos tenros. Estão possuídas pelos lutos que nunca se devem erguer de repente, com estertores dolorosos e inúteis como trapos desfeitos pelo uso.
São as minhas manhãs de pacatos lutos. Manhãs vagarosas, azuladas, que rastejam como bichos ternos, tenros, e se aninham nas copas das árvores e no meu vestido. São manhãs que pisam a humidade, que rasam as pedras das asas do anjo do lago e rugem no dorso das carpas assustadas pelo súbito quebrar do vidro da água. São manhãs acoitadas nos linhos das almofadas que ressumbram o inevitável silêncio da saudade bordada antigamente a ponto cheio nas orlas dos meus linhos.
A sossegada solidão do meu abandono. As quietas memórias dos meus mortos. O aprendido sublimar da dolorosa ausência. A reserva das árvores que não choram e que instruídas oscilam apenas nas mãos das manhãs do azul mais triste.
As mortes, as minhas mortes, são pedaços de terra que eu amanso. Sem tremuras carpidoras, sem a inutilidade do audível arranhar das lágrimas visíveis.
As minhas mortes são a terra que eu amanso, depois de a fazer tombar nas bordaduras dos linhos onde durmo.