4.5.21

A Gaffe divergente

Michael Kutsche

A Gaffe, por estes dias, ficou admiradora incondicional de Bernardo Moniz da Maia, ultrapassando desta forma o desregramento idílico que tinha de quando em vez pelo mavioso e mafioso Berardo.
As cascalhadas do comendador já não ressoam nos corredores da Assembleia da República; a circunspecção do olvido financeiro de Salgado já não parece excitar as bancadas mais concupiscentes do semicírculo; os escárnios e maldizeres do filósofo de panela de pressão parisiense que - diz-se -, sorvia as profundezas do cozido do amigo, já não é de foguetório, pois que um juiz só encontrou o vapor, e nem sequer a energética figura do gestor medalhado que fundiu o fusível da empresa, electriza os assentos parlamentares.

A Gaffe encontra em Bernardo Moniz da Maia o inesperado, o original, o quase genial. O Bernardo é um primoroso príncipe da paródia nacional, a mais requintada fossa da soberba. Um aprimorado pândego capaz de uma monumental indiferença e colossal desprezo ultraterrestre pelas demandas da arraia miúda. O Bernardo consente ser considerado um indigente mental, um imbecil trauliteiro, o centro de galhofa colectiva, um idiota insciente e néscio, mas só depois de ter encontrado no povo português um mealheiro de quinhentos milhões de euros que usará para o que der e sobretudo vier, que neste momento só veio com um parco carrito em leasing.

A representação impossível de Moniz da Maia perante um público convenientemente eleito e que muito se divertiu, é uma obra-prima de menosprezo, de desdém e de sobranceria, que diminui de forma bizarra, mas demasiado eficaz, os meninos deputados e as meninas deputadas que sorriram perante tanto cretinismo e abafaram as risadinhas, descurando o facto da sua própria figura e seu próprio papel na confrangedora peça fazer acreditar que seriam a origem do escárnio do inquirido no final do acto.

Moniz da Maia desvenerou de uma forma levada ao extremo, a trambicada da Assembleia - e as gentes que a elegeram -, ao ponto de lhe ser desapegada e vazia a possibilidade de o considerarem doente mental.

Quinhentos milhões de euros valem bem um país a troçar da figura de tanso e de palerma que mimamos para descansarmos depois nos paraísos que quisermos, enviando a conta aos papalvos que divertidos abafaram as gargalhadinhas das suas tão comprovadas superioridades mentais.

O Bernardo é absolutamente diferente daquele cavalheiro cansativo, muito Downton Abbey, incapaz de assumir o mais ínfimo resvalo social, humano, humanitário ou mesmo financeiro, mas que esconde nos silêncios esconsos de dentro de si um psicopata porco - um porco psicopata -, que se viciou em cocaína e indiferença e que gosta de chafurdar na lama e de arrancar os dentes aos serviçais.

O Bernardo é diferente. Não usa smoking.