Por motivos mais que maçadores e muito mais que óbvios a Gaffe não presta muita atenção a olhares libidinosos. Uma rapariga esperta sabe que é por vezes o alvo do desejo pouco certeiro do sexo contrário, porque sente escaldar os dardos que são disparados na sua direcção, mas raramente lhes dá a importância que merecem.
Excepto em duas ocasiões específicas:
1. - Quando os olhares se tornam de tal maneira insistentes que
acabam por despertar a sua atenção, corroendo a sua altiva indiferença.
São os chamados Olhares Imbecis – OI.
Não são particularmente atraentes;
2. - Quando ao lado desses olhares existem outros que quer
ver, esses sim, dirigidos a si. Olhares
de Assalto – OA.
Há necessariamente que saber lidar com estas duas situações.
No caso dos OI torna-se
fácil reagir. Há várias opções ao seu alcance.
Destaquemos
estas:
a) Um sorriso ameno, como quem
diz: Também gostava
imenso, mas tenho uma reunião no Dubai agorinha mesmo!;
b) Um mimar de um beijo pequenino parecido com aqueles que
atiramos nas festas quando vislumbramos a tia;
c) Um inclinar de cabeça - sempre para o
lado direito - acompanhado de um encolher de ombros subtil e de um fechar de
olhos repleto de ternura, do tipo: Oh!
Que pena eu estar tão acompanhada!
Se todas as hipóteses forem levemente tocadas por Narciso Rodriguez, resulta
sempre.
No
caso dos OA as
coisas podem tornam-se mais complexas.
Os OA apenas
são maçadores quando o rapaz está acompanhada por um colosso saído dos sonhos
mais intensamente hollywoodescos. O rapaz é geralmente o namorado dessa estrela
e, também na generalidade, não suspeita que está a um passo de enfrentar uma
toureira, nem a incauta e inconsciente mulher faz ideia que anda à solta
uma rival. Há que rentabilizar estes percalços.
Convém nestes casos corresponder de forma intensa. É o império do olho por olho. Devemos
insistir até que o rapaz se aperceba que há mais cinema para além do
americano. O nosso encantador cinema europeu e as promessas contidas nos
olhares trocados nestas fitas, fazem milagres.
Uma das estratégias - rasca, mas sempre eficaz -, usada para concluir a aventura
dos OA é,
por exemplo, esquecer no
tampo da mesa o livro barato que se acabou de comprar. Convém não ser uma
obra-prima - porque corremos o risco, embora residual, de ficar sem ele -, e se não quisermos parecer psicopatas com esgotamento cerebral, ou a versão
feminina de um marchand casado
com uma joalheira excêntrica que saponificou, jamais o último da Margarida
Rebelo Pinto.
O esquecimento vai
permitir à inocente menina dos nossos olhos pedir ao rapagão que a acompanhe e
que lhe devolva o esquecido.
Convém que a entrega da obra seja feita com dois flutes, porque uma rapariga esperta gosta de beberricar Moët & Chandon antes de começar a ler o índice.