John LaGatta |
Como já devia ser do conhecimento geral, a Gaffe viveu em Paris durante a maior parte da sua curta existência.
Este pequeno factor é de importância capital - hoje estamos tão trocadilhos!-, porque lhe permite olhar as nossas mulheres, sobretudo as do Porto que ficou a conhecer com mais nitidez, um certo grau de maldade cosmopolita e de certa forma ter uma visão estrangeirada acerca deste assunto.
Paris fornece um allure indiscutível a uma rapariga esperta e capaz de o captar sem questionar muito a essência do fenómeno. Somos parisienses quando deixamos de colocar questões existenciais a toda a hora, fazendo perigar as nossas incendiadas ligações que, embora passageiras, nos deixam prostradas de tanto esforço que exigem para que a mangueira cumpra o seu destino. Somos parisienses quando nos preocupamos com a madeixa do cabelo que nos tomba nos olhos e nos impede de ver com clareza o manequim masculino que passa em cada esquina da Sorbonne. Somos parisienses quando oferecemos razões a um homem para se afastar, cansadas que estamos das suas fracas aproximações. Somos parisienses porque reconhecemos que cada torre, por muito pequena que seja, tem o seu encanto e que não é forçoso ter sido Eiffel a assinar o trabalho para que sejamos agradavelmente surpreendidas pela eficácia da lapiseira.
Somos parisienses, porque sim.
As portuenses não.
As portuenses parecem sempre tristes e há - a Gaffe fala das que conhece -, uma espécie de subordinação às regras sociais estipuladas por machos pacatos e bastante ordeiros que se torna confrangedora e muito pouco saudável. Obedecem, mesmo quando tentam escapar e deixam no ar uma resignação ou culpa que desculpam baseadas na geografia. São do Norte e o Norte foi e continua a ser um feudo masculino.
São de uma fidelidade quase canina, o que é uma maçada. Os casamentos parecem celas de convento do mais pio que há, benzido e de clausura, e não percebem que se há festinhas para troca de maridos, não as há para trocar de amantes.
Finalmente são peritas em provocar sentimentos de culpa quando uma rapariga se descuida e lambe descaradamente uma peça masculina de qualidade rara na Invicta. Fazem-nos acreditar que não passamos de vampiras promíscuas prontas a ferrar o dente na veia mais saliente de um rapaz. O que, apesar de não ser de todo uma mentira, não custa disfarçar e fazer de conta que não se vê com nitidez.
Não é de todo simpático e é maçador.
Causa-lhe urticária ver, como hoje viu, com aqueles dois que a terra há-de comer, uma rapariga com a sua idade, nada e crescida no Porto, presumivelmente culta e inteligente, a borrar a pintura - mais do que o aceitável e tendo em conta que não é perita no sombrear dos olhos e no espalhar do blush -, dizendo a chorar – dizia a Gaffe – que soube do marido enfiado na cama com uma companheira de luta e de trabalho enquanto ela fazia o turno nocturno nas urgências.
A Gaffe não compreende esta absoluta falta de Paris!
Se fosse à sombra da Torre Eiffel tínhamos o caso tratado e dada alta aos três, porque na capital da luz, diria um amigo, uma cama é como um autocarro: há sempre lugar para mais uma.