8.12.21

A Gaffe czarina

Clement Chabernaud

A Gaffe, como seria de esperar, é demasiado exigente com a beleza masculina. A exterior, que a outra, outras paragens requer.

Aguarda, nos rostos e nos corpos dos homens, histórias que a levem e que a pasmem. Espera por cenários e por palcos, por cortinas e fossos de teatro, por soluços de palavras ou de risos, por ofuscantes brilhos ou por baços e tristonhos traços de tragédia.

Belíssimo é o homem que lhe desperta histórias, que lhe oferece de forma impoluta e clara e inocente, pássaros de ópera ou de burlesco, que a leva para dentro de outro espaço apenas por olhar, ou por andar, ou por mover os dedos, por sorrir ou por trazer nos olhos personagens de densos argumentos de romance.


Tomemos o homem de quem tem saudades como exemplo.

É demasiado alto e tem olhos de chuva e anoitecer, de acidulado negro, como quando o frio queima a cor de árvores secas. Tem mãos morenas e demasiado grandes, boca desenhada por compassos e tem no corpo o ondular dos tigres.

Há quem se atreva e diga que talvez este homem seja bonito apenas!

Mas arrasta com ele histórias russas. Paisagens de czares a lançarem no chão nevado as capas de veludo e zibelina e cúpulas de bronze e luas de oiro puro. Faz lembrar as noites de São Petersburgo, quando oficiais do império russo retinham as carruagens geladas às portas dos palácios e silvavam tiros e punhais de regicídios. O resguardado, o que está oculto, erguendo a lenda de príncipes das estepes sem memória.

É avassalador. Belíssimo!

A beleza masculina tem sempre de nos contar histórias. A da mulher pode bem ser muda. 


No entanto, A Gaffe não desdenha os que lhe recordam figuras de cordel. Basta que os fios que os prendem tenham nós que, cegos, se cruzem e baralhem nos seus dedos.