Haddon Sundblom |
O mais assustador da época de Natal não é a visita dos vizinhos que custe o que custar acham por bem vir desejar-nos Boas Festas, mesmo quando não sabíamos que o pecado morava ao lado. São uns queridos, embora nos façam duvidar se é aconselhável trazer com eles o cão e as crianças. O que arrepia é a quantidade vezes que a Gaffe lê e ouve:
- Um desfile de Pais Natal nus em solidariedade
com a TAP;
- Concentração de Pais Natal junto à cadeia de
Évora;
- Manifestação de Pais Natal em protesto contra a
exploração das renas;
- … Pais Natal por todo o lado.
Meus amores, Pais Natal não existe, pese embora
o que nos é dado deles ler na televisão.
O único Pai Natal admissível é o velhote simpático
e bonacheirão que pertence ao imaginário infantil com a bênção da
Coca-Cola. Pais Natal é apenas o que se poderá chamar uma calinada
do arco-da-velha. Se nos referimos aos aglomerados de rapazes enfiados numa
fatiota vermelha de fibra ranhosa, comprada numa loja chinesa, com pedaços de
algodão a descolar na cara e barrete de forcado, convém chamar-lhes pais
natais e sobretudo não esbardalhar cópias nas janelas.
Uma das mais arrepiantes imagens do Natal é esta última. Pais
natais que se cravam nas varandas como se tivessem sido cuspidos do trenó numa
curva mais apertada e estatelado contra os ferros forjados das nossas noites de
Inverno, ou então versões do Chucky que procuram assolar os nossos sonhos
natalícios durante semanas a fio. São pais natais secos, mirrados, desossados e
torcidos, anões que oscilam ao vento e pingam encharcados numa eterna
incapacidade de dobrar o parapeito. Não são bonitos, arrepiam e assustam. São
substituídos, às vezes, por quadrados de pano vermelho com o Menino Jesus
estampado. É igualmente sinistro, mas pelo menos deixamos de nos sentir
assustadas sabendo que há uma coisa antropomórfica a tentar entrar no nosso
quarto.
Pendurar na varanda um bacalhau seria igualmente imbecil,
mas preferível. Teríamos um demolhar mais ecológico.
Outro apontamento a repensar nesta época é a mania de se
atirar com um único fio raquítico de luzinhas de Natal para cima de uma árvore
digna e frondosa e pensar que ficou gira. A pobre acaba a parecer que usa
fio dental comprado numa qualquer sex-shop manhosa. O crime só tem compincha
quando se preenche o arbusto da entrada com a colecção completa de luzinhas dos
OVNIS que o dono da casa costuma avistar. É um piscar incessante e nervoso
capaz de provocar ataques epilépticos a qualquer transeunte menos prevenido e
absolutamente stressante para a ramagem que não vê chegar o fim da tortura,
porque existem ainda os escuteiros.
Os presépios dos escuteiros crescem desalmadamente. Qualquer
jardinzito público viçoso é pasto para estas criaturas capazes de transformar
nesta época um relvado bem tratado numa pasta empapada e enlameada onde
enterram muitos paus, com muitos nós e muita tela, muitos troncos, muita palha
e muita corda. O presépio fica sempre parecido com uma tenda dos Sioux depois
de uma carga de pioneiros americanos e o jardim com as hostes de Custer após a
tareia de Touro Sentado. É aconselhável que durante o Natal não se permita que
estes rapazes saiam dos bosques onde vão acender lareiras e cozinhar coisas
simples. Em alternativa poderemos sempre obrigá-los a cantar o Jingle
bells enfiados na neve até que os bells deles deixem de tocar.
A estes pequenos contratempos natalícios, a Gaffe acrescenta que, cedo ou tarde, se vai esbardalhar contra os miúdos do coro de Santo Amaro de Oeiras
A toooodos um bom NataaaaAAAAALLLL
A toooodos um bom NataaaaaAAAaaaL
mas acredita que, depois de ter enfrentado o referido, os encarará com uma atitude já muito Lexotan.