A Gaffe observa com pasmo dantesco a menina da recepção que toca as teclas do seu PC com a polpa dos dedinhos encimados por uma espécie de floretes esmaltados.
A Gaffe fica fascinada com a perícia com que os dedos erguidos apontando o céu conseguem tocar as vítimas, enquanto as unhas, as nails, o gel, vão riscando o monitor em arrepio de giz.
Ao lado, uma loira ripada e explosiva, atira os dedos e faz deslizar outros punhais de gel no telemóvel, arriscando lancetar a jugular da companheira com um mover das armas mais violento.
A Gaffe fica encantada, enquanto se introduz nas suas envergonhadas e tímidas unhas por prolongar até à curvatura do espaço, a suspeita da maldição que as donas das nails carregam pelas suas vidas íntimas envernizadas em todas as suas extensões e prolongamentos.
É evidente que estas duas mulheres não sentem, por exemplo, a fricção que é, postas perante um rapagão perito em física atómica - e demasiado atraente para que o ouçamos narrar as aventuras dos electrões, dos iões, dos protões e dos positrões, despido pela nosso imaginário mais maroto que deseja apenas que lhe acelerem as partículas -, pousar o nosso dedinho indicador nos lábios carnudos do potentado intelectual e fazer com que os nosso olhos deslizem pelo deslize que vamos desenhando, impedindo-o de continuar a perder tempo.
Com certeza que, no caso em que o gesto é protagonizado pelas duas portadoras de nails, o pobre rapaz acaba com um olho vazado, ou pronto a ser embalsamado à boa maneira egípcia que arrancava o cérebro pelas narinas.
Por razões similares, as coleccionadoras de nails arriscam ser excisadas durante os seus devaneios e solilóquios, transformando ocasiões propícias a alegrias várias - relembremos que saber estar só revela saúde mental -, em trágicas subtracções de capacidades autonómicas. Torna-se também evidente que quando a alegria é partilhada, o lamentável parceiro de folguedos tem grandes hipóteses de ficar sem as bolinhas, mesmo que sejam de Berlim e fáceis de azedar, reconhecendo-se também que a piloca corre grandes riscos de ser aberta a todo o comprimento como uma sardinha sanjoanina ou como uma salsicha de feira popular - de preferência alemã.
A Gaffe não vai por decência - atributo que muito a caracteriza -, reportar-se às idas ao WC destas portadoras de armas brancas, sobretudo porque acredita que as criaturas não usam as sanitas. São provavelmente como Isabel II - parabéns, rapariga! -, que a Gaffe em criança acreditava piamente não ter intestinos, por razões que excedem o âmbito deste pequeno rabisco. Em consequência, os resíduos alojam-se no cérebro.
Posto assim, há que admitir que existem algumas das mais importantes intimidades gravemente abaladas pelo uso de nails cuja única vantagem é apenas a possibilidade de se usarem como chaves de fendas, pese embora o problema referido atrás.
Antes de colar nos dedos os parolos punhais da mais rafeira das escolhas estéticas, pensem, minhas queridas, que cravar as unhas naquele físico atómico lindo de se morrer repleta de descargas - sendo bem-vindo tudo o for que se dispare - não implica um entendimento literal da acção enunciada. Basta, meus, amores, um dedinho nosso, de garras recolhidas, a contornar os lábios com silêncios.