O desgraçado conceito de beleza interior devia ser banido ou exorcizado, condenado como insulto castrador, exilado como um pesadelo.
Uma rapariga sai do cabeleireiro com a Primavera no cabelo, vestida de milagres Comme des Garçons, de bâton sedoso e olhos de oceano, de carteira pequenina à tiracolo e Louboutin nos pés, a sentir-se fabulosa e dona de um mealheiro que já permite a compra da chaise-longue com nome de pessoa que ficará tão bem voltada para varanda para ouvir o mar enquanto lê e esbardalha-se contra o penedo da beleza interior é a que importa. Apenas o que é belo e não se vê, é perene.
Normalmente sai da boca de uma abantesma rechonchuda e pequenina, anafadinha e entradota ou de um espectro de bigodinho fino, sobrancelhas pintadas de preto e fatinho cinza direitinho que erguem à nossa frente as sombras da derrocada física, mostrando-nos o descalabro que nos espera, o encarquilhar, o desabar, a queda abismal no poço da velhice senil e a morte inevitável que nos transforma em pó, em cinza, em nada. Se não resulta e continuamos a sorrir, cravam-nos na pele do dia claro as trevas do 11 de Setembro que há em cada dia, dos pobrezinhos, dos esfomeados, das vítimas dos tsunamis terroristas, dos miseráveis, dos espoliados, dos exilados e da carriça da Nova Zelândia em perigo de extinção. Terminam afirmando que a única beleza que perdura é a interior.
A verdade é que a tão aureolada beleza interior, ainda mais subjectiva do que a outra porque é a alma que ousamos perscrutar, é um berbicacho idiota. Podemos não encontrar a Madre Teresa no interior de Gisele Bündchen, mas se virarmos a Madre de Calcutá do avesso - Deus nos poupe -, encontraremos coisa pouco digna de ser fotografada, tendo em conta que a senhora velhinha era uma cabra tirânica e sádica para as subordinadas.
Sejamos felizes e ricas e caras e promíscuas e esqueçamos que vamos morrer.