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Daniel Serva |
É certo e sabido.
A morte de G. Ford - no seu rancho californiano, evidentemente -, e as passeatas que por aqui faço com a minha avó, recordaram-me, não o famigerado e infeliz presidente que sofreu a desgraça de substituir o escabroso Nixon e padecer do fracasso vietnamita, mas - sofra-se a confusa miscelânea presidencial -, Mrs. Nancy Reagan.
Uma mulher nunca é demasiado magra.
Esta máxima, elaborada pela cowgirl que casou com o homem que achava que as árvores eram causadoras de danos ambientais, pode ser considerada pretexto para os gigantescos passeios de início de Primavera com que, pela tarde de fim-de-semana, eu e a minha avó queimamos calorias.
Esguia, delicada, delgada e subtil, a minha avó jamais poderá
amaldiçoar as suas inexistentes gorduras, flácidas rotundidades ou circular
corpulência, mas a fogueira que insiste em atear nestes passeios tem como único
objectivo o calor cúmplice, exclusivo, que se cria entre ambas.
Diz-mo enquanto encosto a cabeça ao seu braço, pendurado nele que me envolve.
Descubro que há diversos e distintos modos das pessoas que mais amo caminharem comigo.
Prendo o meu corpo à minha avó como serena trepadeira, mimada, terna
e doce, com a certeza de que o muro é bem sólido e que posso deixar que as
folhas se espraiem sem medo ou queixume.
A minha mãe, namoriscando, tomba presa no meu pulso, como uma breve e
minúscula pulseira de oiro batida pelo sol.
O meu pai caminha comigo como se eu fosse um alfinete de gravata:
dispensável, mas que se quer mostrar, porque se ama.
A minha irmã leva-me com ela, mas nunca vem comigo.
A minha prima pendura no meu braço o seu corrosivo humor, a sua
indomável inquietude e a sua irresistível obstinação e rebeldia e transforma-se
na mais aventurosa das cúmplices, na mais destemida aliada.
O meu irmão é bem maior que eu. Caminha comigo e sei sempre onde
piso. É como ter um mapa e uma bússola, sextante e astrolábio. Sabemos onde
fica a estrela certa.
Mas só o meu avô sabia caminhar sorrindo devagar toda a jornada.