9.8.23

A Gaffe e o Príncipe Sapo


No regresso aos dias nostálgicos e entristecidos, a Gaffe retorna ao seu quotidiano mais banal e insípido, continuando a sonhar ver surgir a famigerada luz ao fundo do túnel.

Nós, raparigas espertas, alteramos significativamente este conceito de luminosidade. O reluzir do pavio acesso, na negrura do caminho, pode significar, não raras vezes, o reflexo de um raio de sol que se distrai no metal polido da armadura de um príncipe.

Todas as mulheres o esperam. Todas as mulheres aguardam, mesmo que secretamente, que surja o cavaleiro que as tomará nos braços de Cantigas de Amigo e as arrebatará, transformando em veludo e rosas as pedrinhas nos Louboutin, nos Jimmy Choo, ou nas miseráveis sabrinas que os substituem nos tempos que correm.
O sonhado cavaleiro, para além de garboso, de divinal beleza, servo submisso, valente protector e de galante fraseado, deverá amar-nos desmesuradamente, com consciência da precária certeza de nos ter. Para nos seduzir, será obrigado a rasgar a alma nos espinhos que nos rodeiam e afogar a montada nos fossos que cercam o castelo onde adormecemos frágeis, mas com um olho aberto.

Embora nem todos os sapos tragam príncipes dentro, acredito que todos os homens trazem príncipes. Alguns, com o tempo, tornam-se sapos e essa metamorfose é irreversível.
Sabemos, por instinto, que os sapos só nos seduzem se nos obedecerem, mimarem, bajularem, atormentarem com presentes, venerarem, acariciarem o malfadado gato que adoramos, glorificarem as nossas pequenas idiossincrasias, canonizarem as nossas exigências, incensarem as nossas compras mais idiotas, afagarem os nossos desânimos e as nossas frustrações e correrem atrás do táxi quando decidimos ir embora.

Só o acatar destas condições permite a um sapo aspirar a seduzir-nos.

Temos tendência para revelar o lado mais negro, mais mesquinho, mais medíocre e mais torpe das nossas almas, quando o sapo não é o nosso príncipe, porque sabemos que, se para nos seduzir, ele terá de cumprir na perfeição todas as situações enumeradas - e muitas mais de que não se fala por pudor -, enquanto que nós, para o arrebatar, temos apenas de lhe aparecer todas nuas.