É tão bom poder observar sem as interferências do costume, sem o burburinho banal que é livre e que rasteja nos dias a que chamam úteis e em que são obrigadas a outros ataques bem menos perigosos, o modo de caçar das mulheres em que a crueldade desalmada inclui o maior desprezo pelas vítimas.
Felinas na caçada.
Nelas o desejo de agarrar irrompe como labareda. Com o tempo aprendem a controlar a área atingida e a circunscrever, a delimitar, o perímetro de ataque. Desta forma, nunca os terrenos limítrofes acabam calcinados. Os seus planos de ataque contemplam cirurgias de topo e estratégias quase cínicas de tão geladas, quase impudicas de tão calculadas.
Esta aprendizagem leva menos tempo do que se esperaria. Aprendem depressa a esperar de garras recolhidas, contra o vento, aninhadas no desespero que é querer rasgar a vítima, mas a perceber que nem sempre é tempo de gamos tontos, distraídos, de pescoço inclinado e limpo, de jugular à vista. Assimilam esta aprendizagem com a perícia dos sobredotados e as emboscadas são agora antecâmaras de festim seguro.
Há, no entanto, uma ligeira lacuna neste caçar certeiro e implacável. Nem sempre detectam o milésimo de segundo em que se pode e se deve desferir o golpe derrubando o corpo que resistirá se perdida essa ínfima fracção de tempo imprescindível ao ataque. Chegam muitas vezes extenuadas ao fim da luta. Com a vítima nas garras, o sabor da carne nos caninos, mas já quase sem fome. Entediadas.
Se as caçadas são certeiras, violentas apenas porque deixam em ruínas as almas apanhadas, é só porque a perícia do ataque resulta do pressentir do momento em que a vítima se distrai, desvia, deriva, afasta e se entrega imprudente ao outro lado do perigo, àquele que confunde com um lugar seguro. Então saltam e mordem a jugular, matando.
Espreitam. Espiam. Esperam.
Há sempre uma imperceptível faísca incolor nos olhos do que se quer. Dura uma fracção de tempo indefinida e de tão breve é quase imperceptível, mas as mulheres percebem que a conseguem ver a trucidar o céu daqueles que sabem degolar. Quando a vislumbram, levantam a pata de garras distendidas e abocanham a presa.
São predadoras de topo, carnívoras muitas vezes sebentas e sempre sedentas. Rasgam de forma idêntica os tendões às vítimas e abandonam sempre os corações.
Existe apenas uma diferença entre elas no modo de caçar: Umas atacam ao pressentir a distracção ténue da presa, enquanto outras a imolam no exacto e infinitesimal instante em que a vigilância entrevê o perigo.
São mulheres - com gatos - de quem J.D. Vance tem medo.
Normalmente a solidão agrada-lhes como um lugar sem dor.