O fumo faz-lhe erguer a
sobrancelha. A minha avó chega atrasada e justifica:
- Uma mulher deve-se adornar
para os homens belos. São os únicos que a conseguem ver despida.
Sorri. Que não a incomoda o corar
do meu irmão.
Entrega-lhe o isqueiro para que
lhe abrase um cigarro novo. Depois brinca com a cigarreira aberta.
- Reparo, meu querido, que se
refere a ela como a sua amiga. Soa a Cantiga com iluminuras, mas porque
não diz a minha amante? Sabe que mudam de cor essas palavras sempre que
são ditas?
Não sabe. É tão pequeno e
triste como eu.
- Mas é verdade. Dizer a
minha amante transforma os lábios e a cor dos olhos. As palavras ganham
todas as nuances da alma de quem diz.
A senhora e a cigarreira de
prata que não se abre à luz que vem coada por um quebra-luz. Um
quebra-luz, avó, que a luz pode quebrar, mas não se abate.
- Na minha boca, meu caro, o
meu amante sempre teve a cor do meu bâton.
A senhora afasta a onda do
cabelo.
- Ciclamen Rose. - Um suspiro que
faz doer como um corte de papel.
- A cor do meu bâton. Já
não existe.
E a senhora fecha a cigarreira com um clique.
Gaffe- 03/07/2014