Não é fácil erguermo-nos a brilhar nas preguiçosas manhãs do nosso descontentamento, sobretudo quando nos sentimos desgrenhadas, ensonadas e com todos os sentidos anestesiados.
Embora com uma nuance significativa, a última vez que o conselho que se viu estampado na t-shirt Rise and Shine surtiu efeito, foi com Lázaro e só porque chegou directamente de Jesus. Mesmo assim, Lázaro nunca mais se livrou convenientemente do cheiro que lhe carcomia a sedução.
Não nos acordem com a promessa de uma manhã de sol aberto. Nós não fazemos fotossíntese.
Erguermo-nos radiosas nas vossas manhãs, rapazes, é uma impossibilidade mais do que comprovada.Tornamo-nos patéticas quando teimamos em levantar as pálpebras com a sombra YSL inabalável que usamos na véspera ou com o bâton sangue-de-boi Dior - a cor do bâton não engrandece o costureiro - a preencher na perfeição os nossos lábios frescos de brisa matinal.
É inevitável esbandalharmos a tela magnífica da véspera. É impossível imprimirmos sem sequelas o rosto maquilhado na almofada alva - qual sudário -, que nos suportou o peso da inércia, da exaustão e da impaciência que nos fez adormecer com pestanas postiças que acordam coladas nas axilas, pregando-nos um susto horripilante. Acordamos espapaçadas na cama, penosas vezes de boca aberta e em poses pouco dignificantes, muitas de nós a babar-se e a roncar - não pensem que vão ouvir os rouxinóis -, sem cabeleireiros, aderecistas, iluminação, maquilhadores, banda sonora e tropas da elite oscarizada enfiadas no armário.
Nenhuma rapariga, por muito que se esforce, vai amanhecer erguendo-se com a subtileza da gazela, o gesto alado da mariposa ou a esguia elegância do cisne, qual Catherine Deneuve ou Grace Kelly - citadas para apoiar a alusão a Lázaro.
Por muito que esperneiem, nem as fadas, ninfas e sílfides,
princesas de outras eras e da nossa, rainhas de beleza e sedutoras divas,
jaguares no feminino, panteras negras, íbis do Nilo e de outros rios que não
passam pela minha aldeia, trapezistas do encanto e do fascínio, Mata-Hari que
segreda apenas mel e todas as ritas pereiras com que sonham, acordam com um
hálito a mentol.
Rapazes, deixem de nos massacrar com ilusões de folhas de revista ou de frames de uma fita com glamour e ouçam a voz do ancião do pico da montanha do real:
Wake Up and Smell the Coffee!
Anote-se, no entanto, que uma rapariga também não precisa, todas as manhãs, de perceber que a vossa vida, rapazes, não saiu directa das páginas do KamaSutra e é apenas um folheto de Carnaval ou um pindérico romance de cordel.
As vossas olheiras, os vossos papos, as vossas manchas e maleitas faciais, as vossas borbulhas, os vossos lanhos labiais e outras pequenas mazelas, não nos deixam entusiasmadas. Mesmo aquele aspecto desregrado, normalmente acompanhado de um sorriso patético, de quem não dormiu por ter estado ocupado em manter acordada a companhia, não é, de todo, atraente para uma rapariga que começa a debicar o seu croissant.
Depois, apesar de todas nós sabermos que só os vegetarianos conseguem ter na boca a frescura de uma horta orvalhada ou no mínimo de uma salada minimal, nunca uma rapariga permanecerá por muito tempo no palato de um homem que lhe lembra a dieta.