Creio que todos temos na alma um pequeno botão - imagino-o vermelho - que se tocado faz iniciar a nossa muito particular autodestruição. Desconhecemos onde está situado e por isso tacteamos quase cegos tentando que os nossos dedos não encontrem a imperceptível pressão que nos levará ao fundo ou a implodir desfeitos em poeira.
Somos assustados resistentes sem a consciência da ameaça, mas atentos, instintivamente atentos, à procura da sobrevivência.
Se tocado, o botão desencadeia o abismo.
Esbracejamos como náufragos e como náufragos agarramos a fúria de pensar que fomos e estamos inocentes. Tentamos respirar através da culpabilização dos outros. É o nosso pedaço de madeira a flutuar.
Só os Grandes, os que não trazem medida, os que não usam conta-gotas na alma, se apercebem do início do precipício e assumem a consciência do próprio pecado. Sabem que são os únicos responsáveis pela derrocada e retiram os outros das falésias antes de morrer. Ilibam os outros.
Desfazem-se depois, mas sem poeira.
Ilustração - Fernando Vicente