Por iliteracia, por profunda e vergonhosa incultura, por inépcia declarada e por falta escabrosa de estudo e de paciência, a Gaffe sempre considerou sobrevalorizada a obra de Tolentino de Mendonça.
Um pecado que esta rapariga nunca se cansa de cometer, até porque o cardeal foi escolhido pelo beato Marcelo para liderar o 10 de Junho do ano da Graça - uma querida - de 2020 por exactamente ser um ilustríssimo e nobilíssimo poeta, digno de Camões e de tantos mais. Outra razão qualquer seria de um deslumbramento parolo e pindérico confrangedor.
Esta renegada iletrada enfia o poeta, o ensaísta, o doutor, o príncipe da Igreja, o erudito, o presidente das comemorações do dia de Portugal e de Camões - e mais que não se diz, porque não se sabe -, mesmo ao fundo das vielas esconsas da biblioteca, logo atrás dos mais caseirinhos, maçadores e doentios poetas e mesmo ao lado dos Grandes Chatos - uma corrente que sobrevive ao tempo e que floresce amiúde.
Tolentino de Mendonça é um digníssimo representante deste grupo bafejado por musas mais ou menos moncosas e ligeiramente sebáceas, fortemente céreas e cerúleas, encaixando no nicho que ninguém consegue ler sem bruxulear de tédio, mas que de súbito, por acasos e ocasos de orações, se torna importante dizer que veneramos e que consideramos um marco na história da literatura universal.
É evidente que os escritos de Tolentino de Mendonça estão agora mais rubros com a adição do cardinal do barrete, mas aos olhos desta imbecil, despudorada e bruta rapariga, vestes e obra surgem escorregadias, untosas, ligeiramente viscosas e amareladas como gente constipada. Talvez porque Tolentino é amanteigado. Talvez porque Tolentino lhe pareça demasiado santo, demasiado papável, demasiado turificado, demasiado inchado pelo peso desmesurado dos poderosos segredos vaticanos que vai embuchando, ele que sempre pareceu um homem de pequenos segredinhos.
Injusta, esta rapariga tonta, com certeza, e paradoxal, posto que, depois desta exposta colecção de impropérios, reconhece que Sua Eminência é um dos mais brilhantes, extraordinários, esclarecidos e cultos intelectos com que fomos abençoados e que será sem sombra de dúvida um magnífico papa.
É facílimo descoagular a benignidade santa daqueles que se escapam à sina de pecado dos mortais que sorvem de um trago as borras de um café torrado nos infernos. Difícil é aceitar a pureza pia de enjoativas natas servidas em porcelana glorificada pelas cores papais.