19.4.22

A Gaffe no quarto do "bebé"


A Gaffe compreende que seja necessário um tempo substancial para que as meninas descolem os olhos do rabiosque deste rapagão.
A Gaffe demorou mais do que o previsto na Lei e solidariamente espera que lhe arranquem as pupilas esbugalhadas pelo descuido.

Posto isto, minhas queridas, urge fazer algumas considerações.

Por muito empobrecedor que seja, não são les petites choses mais badaladas ou mais edificantes que, incensadas por nós, definem um homem.

Por muito que desgoste as mais puristas, as mais moralizadoras ou as mais velhas, não são as árvores que plantaram, os livros que escreveram ou o Bugatti que conduzem o que permite o desvendar de um homem.

É o seu quarto.

Evidentemente que os decoradores minimalistas nos confundem. Um inteligente despojamento – sobretudo o que custa os olhos que finalmente conseguimos desencravar do rabo da imagem - é sempre uma ocultação de planos de intimidade mais subterrâneos, apesar de não ser de todo inócuo, por fazer pressentir no dono um desapego caro, uma quase indiferença pela memória, um despido alerta de possível solidão futura.
Podemos fazer o que quisermos do rabo minimalista, tendo sempre a porta de saída como ponto de foco.

São os quartos mais povoados que nos falam do seu habitante.

A Gaffe exemplifica aproveitando o cubículo onde se encontra o rabinho do rapaz.
Observemos apenas cinco pormenores que próximos estão do que nos distrai:

I
Um urso de peluche.

Fujam de homens que dormem com bonecos – sobretudo bonecos que se barbeiam e que não descem a tampa da sanita. São homens que usam diminutivos parvos que substituem os nossos nomes. Num instante passamos a ser Gabi, Liluzinha, pipoquinha ou, na pior das hipóteses, morzinho.
Um peluche na cama de um homem, é uma ordem de fuga. Convém que a acatemos antes do rapaz telefonar a mãe a relatar-lhe o dia.
II

A colecção de fotografias colada à cabeceira da cama.

Se não apreciamos o espírito de missão – sejamos subtis – que nestes casos nos permitiria olhar para o tecto -, acabamos a comparar as nossas maminhas com os opulentos melões esbardalhados no estuque. Temos de admitir que não é de todo excitante ter um bando de senhoras nuas, muito dadas, a mirar-nos sorridentes, enquanto fazemos de conta que pertencemos ao Cirque du Soleil.
Não é seguro acreditar que se as fotos forem do John Wayne ou de Stephen Hawking altera o desconforto. Para quem é fã do ménage à trois ou em multidão, as fotos das meninas, apesar de tudo, são mais produtivas. Um homem que é capaz de nos mostrar a cabeceira povoada por cartazes mamalhudos, tem debaixo da cama revistas pornográficas e espreita a vizinha pelo telescópio.

III
Os crocs!

Sendo a mais foleiras das criações da humanidade, os crocs - ou croques, depende muito do enjoo -,  são o fundo do poço. Ninguém, rigorosamente ninguém – incluindo cães pequenos e gatos anafados - deve ir para a cama com um homem capaz de usar aberrações nos pés. Se certo é que vários estudos referem que um rapagão que mantém as peúgas calçadas enquanto nos mostra do que é capaz, é mais bafejado – não há bons amantes de pés frios -, e se a bem da Nação nos conformamos com esta ciência, não podemos relevar uns crocs no chão.
Um homem que é capaz de usar crocs, aparece de bermudas e T-shirt no jantar da Cruz Vermelha, só para justificar o sorriso de Charlene.

IV
Um Instrumento musical.

É certo que aquela guitarra eléctrica vai guinchar e ganir, mais cedo ou mais tarde. É certo que vamos ter de ouvir o mix a cover ou o remake de coisas estranhas enquanto esperamos que seja outra a versão a fazer-nos vibrar. Os homens que nos forçam a testemunhar o talento que não têm, merecem que tentemos despejar as garrafinhas de água na tomada onde ligaram o instrumento - que não é exactamente aquele que as meninas nestas alturas se limitam a esperar.

V
A ausência de livros.

Só devemos ir para a cama com um homem que está a ler um bom livro ou que o acabou de fazer.

Cinco pormenores decisivos para o disparar do alerta vermelho. Se não fugirmos depois de os conhecer, é porque o rapagão é o da imagem e, apesar de tudo, vale sempre mais um rabo daqueles na mão do que um quarto decorado pelo Querido mudei a Casa.