O estereótipo é a maior simplificação do pensamento. O amalgamar das variantes e da miríade de nuances do raciocínio e por consequência, sendo errado, acaba por facilitar um entendimento do social – embora circunscrito - sem requerer esforço.
Nessa perspectiva é útil.
Uma das muitas imagens da mulher que se foram construindo ao longo dos séculos, liga-se à tonalidade da pele, à sua tez.
Morenas, loiras e ruivas são caracterizadas com alguma perícia e o tempo encarregou-se de enganadoramente lhes atribuir determinados comportamentos que são tidos como factos e que acabam por fazer as delícias dos homens menos atentos e com propensão para generalizações.
Consultando alguns dos seus amigos, a Gaffe apurou que, num
resumo, as morenas são tidas como detentoras de uma sensualidade e de uma
voluptuosidade digna de nota. São carnívoras e capazes de crimes passionais.
Exuberantes, muitas vezes histriónicas, são as representantes das latinas
capazes de urdir tramas de amor trágico, atrair Quasimodo e protagonizar óperas
repletas de salero. Impulsivas, corajosas e emotivas, são aquelas que fazem
parar o trânsito as bambolear as ancas potentes e sinuosas de amazonas com as
mamocas intactas. Jane Russell e Sophia Loren são ilustríssimas representantes
desta cor.
As loiras são frágeis - salvaguardando-se um lugar de
excepção para valquírias de mais de cem quilos -, racionais e calculistas.
Protagonizam cenas de Hitchcock e produzem belíssimas princesas de contos de
fadas. Frias a roçar o frígido, surgem muitas vezes inalcançáveis e distantes,
embora consigam fazer explodir uma incalculável panóplia de fantasias
masculinas quando aliam esta aparente inocência de gazela a uma granada de sexo
sem cavilha, como é exemplo Monroe. Capazes de tecer dramáticos enredos em que
são quase sempre vítimas depois de assassinar alguém ou heroínas de anedotas
que fazem parecer que mirraram o cérebro com o platinado. Grace Kelly é hitchcockiana,
Monroe a mais bela encarnação de uma guerra aberta dentro dos lençóis.
Restam as ruivas.
Hayworth é uma das mais poderosas ruivas de que há
memória. Gilda é incandescente e herdeira de feiticeiras medievas,
amantes de Lúcifer e donas do medo.
A dificuldade de enfrentarem o sol escondeu as ruivas nas
sombras condenadas. São más, maquiavélicas, esconsas e perigosas. São raras por
maldade e comuns também por ela. Não se confia numa ruiva. Nenhum segredo está
a salvo de se tornar a bala com que a ruiva atinge o que deseja e o que deseja
é sempre carne ou rubis roubados e mesmo quando Jessica Rabbit se torna o sonho
desenhado de qualquer rapaz, é de vermelho sanguinário que se veste.
Esta tipificação do feminino não deixa de ser interessante. Não causa dano ao universo feminino e é bem mais benevolente do que os
estereótipos com que resumimos os homens. As mulheres cultivam-na
subtilmente e as mais espertas não a deixam esbater nas mãos de um feminismo
radical. Usam-na para colorir os dias dos rapazes fáceis e banais.
Afinal um estereótipo não passa da mais simples maneira de os enganar.
Exacatmente por isso, a Gaffe suplicou ao seu querido amigo
que a representasse digitalmente e a partir do que é de carne e osso - com uma
subtil alusão ao seu petit nom.
Temeu que o rapagão a representasse como uma das Barbies da
geração mais recente. Uma gorduchinha, uma baixinha, uma ruiva, ou uma mulata,
mas a bonequinha nunca lhe pareceu suficientemente bem vestida, toda a vida
usou bagatelas de plástico e sempre foi muito limitada, tendo em consideração
que namora um rapaz sem pila. A ideia podia ser mesmo desagradável, mas seria
sempre relativamente pouco original, sofrendo de apatia sexual.
A Gaffe ficou comovida com o que lhe foi oferecido.
Uma alegria marejou-lhe os olhos quando esbarrou com este Jaguar digital.
Depois de pouco hesitar, o moçoilo apresentou-lhe esta versão da Gaffe – que a rapariga não se cansa de publicitar! -, que rivaliza com as heroínas da Disney e, para gáudio das multidões embevecidas, é a única que faz jus à sua extraordinária sofisticação e inigualável galmour e que ao mesmo tempo comprova que a Gaffe não é nada modesta e nada exibicionista - subtilezas muito inteligentes.