10.8.23

A Gaffe simbiótica

J. Stanford

Sei que a minha vida depende da agenda dos outros.
Trata-se de uma relação mais simbiótica do que parasitária. Forneço a possibilidade de me controlarem a banalidade e, em troca, oferecem-me a capacidade de os manipular devagarinho, quando as questões me parecem vitais para o meu equilíbrio interior naturalmente instável.

Pode parecer cínico, mas é muito cómodo.

É-me indiferente o facto de, ontem ao fim da tarde, me terem arrancado do sossego, com um desordenada e aborrecida sugestão, pois que seria benéfico passar uns repousantes dias no Porto, antes de férias.

- Desta vez não haverá a desculpa das florinhas para regar aqui. A priminha garantirá que restarão apenas as flores da tua cabeça.

Aprendi que se torna muito mais saudável se me deixar levar em vez de espernear e me debater em nome de causas que não afectam o que realmente desejo.

A maior parte das vezes, o controlo que pensamos exercer sobre a vida dos outros, não passa de uma forma subtil de sermos manipulados por eles.

Acordei hoje  com o chilrear de umas coisas com penas e com bicos, a minha Josefa trouxe-me o pequeno-almoço e na bandeja havia beijos e ternura para barrar o pão quente e a minha prima, futura agente dupla, está no jardim a cantar desenfreada Singing in the rain.

Tudo está correcto. Tenho apenas de verificar a consistência dos fios dos fantoches.