As mulheres adornam-se desde tempos imemoriais. Os objectivos são inúmeros e as razões variadíssimas. Ciclos de fertilidade, etapas de crescimento e de maturidade, ritos iniciáticos ou ondas de sedução, religiosa ou pagã, tornaram o corpo, preferencialmente o feminino, num palco de excelência.
Neste metamorfosear de fascínios, a arrogância masculina
chamou a si a possibilidade de o adorno ser a homenagem da mulher que se objectifica através
do somatório de atavios, marcas, signos, enfeites ou adereços, submetendo-se à
capacidade de domínio do macho, contrariando a mais habitual forma de seduzir
das outras espécies em que é o macho que se enfeita.
Na esmagadora maioria das vezes, esta certeza é um dos
masculinos momentos de ilusão, porque não tem em conta que se nós, raparigas,
sobre o corpo colocamos os mais extraordinários signos de beleza, fazemo-lo
sobretudo porque a nossa pele exige que nela sejam acolhidas todas as joias que inventamos.
Adornamo-nos sobretudo para nós. O resto são despojos.
Grande parte do poder de sedução de uma mulher, das ciladas
que ergue em redor da vítima, do irreversível precipício no seu corpo, não está
na importância – ao contrário do que se pensa -, mas exactamente na pouca importância
que atribui aos atavios.
Um zoólogo que por aqui passou e deixou na Gaffe tenazes e
animalescas recordações falou-lhe - não sei se lhe mentiu, mas se o fez foi por
causa forte -, no erro genético que produziu as panteras de cor negra.
Não são de modo nenhum uniformes, da cor da noite por inteiro, e as manchas,
essas mais negras ainda do que resto, são visíveis nos seus corpos maleáveis e
esguios se lhes dedicarmos atenção e lhes respeitarmos o perigo.
A genética que lhes apagou erradamente a cor ocre fez do animal um dos mais
perigosos do reino.
A Gaffe suspeita que a mesma genética que apagou o ouro dos
felinos, dissolveu nas mulheres a capacidade de atribuir demasiada importância
aos homens que desejam ou àqueles que querem caçar, transformando-as em
gatinhas mornas de com atavios ronronantes que aguardam que a presa fique ao alcance das
garras e que esperam que seja impossível deixar de acariciar.
E como gatas que somos damos pouca importância ao tempo das coisas e um homem é sempre como um acessório. Adorna na perfeição o corpo da mulher, mas tem a durabilidade da estação que quisermos.