Lembro-me, já lá vão alguns anos, antes de voarmos pela Rua de Cedofeita todas as tardes em bando tresloucado de pardais, de pararmos no café destinado a uma certa boémia quase decadente que atirava bolas de sabão aos muros da vida com a facilidade dos imaturos. Nesses fins de tarde, estalando gargalhadas e tilintando copos, víamos passar uma rapariga que nos intrigava, espalhando no ar os devaneios que se prendiam ao seu sorriso solar.
Lembro-me que usava peças desencontradas, oriundos de universos díspares, muitas vezes contraditórios. Tules de palcos barrocos, chapéus de Al Capone, rendas Sevilhanas presas nos dedos, blusas de românticas paragens, fitas de veludo nocturnas de Chopin, sapatos de rapaz que estuda em Oxford e lenços que eram pássaros a passar.
A intrigante figura de menina-puzzle provocava os mais diversos dislates nos rapazes e alguns remoques tontos na boca das meninas.
Deixei de a ver há alguns anos.
Mas como no tempo já passado do velho café das ilusões banais, vejo-a ainda a voltear como as nuvens frágeis dos enredos que só ela sabia unir com a luminosidade do sorriso transparente.
Mas como no tempo já passado do velho café das ilusões banais, vejo-a ainda a voltear como as nuvens frágeis dos enredos que só ela sabia unir com a luminosidade do sorriso transparente.