1.8.24
A Gaffe quase LEGO
É uma maçada uma rapariga ser obrigada a pensar, depois de ter lido artigos inteligentíssimos relativos aos trabalhos dos novos deputados do Paramento Europeu. Noblesse oblige e o jornal dedica-lhe prazenteiro artigo ilustrado proficuamente com fotografias dos ditos.
A verdade é que seria muito mais fácil deixar que o vento deslizasse por entre as faldas e as fraldas da montanha que um ratito conheceu biblicamente, mas o certo é que uma menina cuidadosa não pode permitir que a estação passe sem que a sua brisa se faça sentir ainda que leve, levemente como quem chama por si.
É um aborrecimento fazer de conta que ignorámos que um político, ou um voluntário a tal em nome da plebe, insinua com uma imagem - física, fotografada, visualmente palpável - as suas ambições eleitorais. A representação tem um poder de conversão significativo e cria e recria um elo de ligação, uma espécie de relação pessoal, entre o eleitor e o candidato.
A imagem adquire uma natureza representativa - paternalista? -, que sendo ao mesmo tempo uma supressão da linguagem, se torna consequentemente apta a enformar uma arma capaz de se escapar a um corpo de problemas e de soluções, para dar relevo a um modo de ser, a um estatuto social e mesmo moral.
A imagem do candidato é em consequência um provável assalto do irracional ao espaço que em princípio deverá ser o da racionalidade.
Desta forma, a juventudo de Bugalho ou o dentito de Temido - enfim, a imagem de marca de qualquer político -, não consubstancia, de todo, o seu projecto, declara apenas o seu móbil, as suas circunstâncias físicas, mentais e até mesmo eróticas, o ser que ele é, o produto, o exemplo, o isco.
É mais do que evidente que a esmagadora maioria dos políticos nos dão a ler na sua imagem apenas as normas - sociais, mentais, morais -, a que obedecem, mas convém acrescentar que essa mesma imagem impõe uma cumplicidade, porque nos permite ler o que nos é familiar, o que nos é conhecido, propondo-nos, em espelho, a nossa própria imagem, enaltecida, sobrevalorizada, transformada em convite para que nos elejamos a nós, através dos que a revelam. Entregamos um mandato a quem nos concebe uma verdadeira transferência física.
É evidente que a juventude de Bugalho – ou a circunspecção de Assis -, permitiu uma visualização, uma majoração, de valores que tantos consideram essenciais. É evidente que estabeleceu uma cumplicidade visual com determinado grupo, mas não é suficiente, mas não autoriza a certeza de uma posterior e intransigente defesa desses mesmos valores. Não é um ideal político explanado, não é uma ideologia, não é um projecto, não é um plano, não é um programa. É um homem que vestiu uma determinada idade, contra o aparente bom senso, que, nestes exactos e precisos casos, funciona como defensor acérrimo de um mundo homogéneo, ao abrigo de perturbações e de fugas. Um mundo replicável.
Seria interessante que, ao contrário do usual, os futuros eleitos nos surgissem como coisinhas por montar - muito Ikea, quase LEGO. Os eleitores escolheriam as que queriam ver montadas.