6.9.23

A Gaffe escreve ao Ministro

Alunas da George Washington University, Washington, DC

Meu caríssimo João,

Devo dizer, antes de tudo, que o considero o ministro mais atraente e mais alto do governo, sobretudo quando aparece ao lado de da ministra da agricultura ou da justiça – nesta altura uma pessoa confunde já os ministérios.


Posto isto, e sabendo que uma rapariga ajuizada está sempre predisposta a não acolher com bons olhos as diabruras com que criaturas mal-intencionadas e feias costumam sujar o chão pisado por um homem sensual, prontifico-me a enfrentar por si a turba esfaimada.

Admiro a sua sensatez, fico deslumbrada com a lógica filosófica sublimada nas suas decisões e não posso deixar de prestar a minha homenagem e de lhe apresentar total solidariedade, quando o vejo martirizado perante acusações injustíssimas que lhe ferem o orgulho e minam as suas boas intenções.

Miúdos sem professores durante a totalidade dos anos lectivos, lapso imputado escandalosamente à ineficácia da equipa que lidera, são claros atrasos destes grevistas que por tradição chegam sempre quinze minutos depois do segundo toque. Toda a gente sabe desde tempos imemoriais que os alunos esperam imenso que o docente se arraste pelos corredores até chegar à sala, sempre a queixar-se que não tem tempo para dar o programa todo com turmas formadas por um número infindável de burocracias. Todas as pessoas de bem sabem que um professor é como um general. Deve saber liderar os seus soldados, incutir-lhes valores morais, cívicos e disciplinados, castigar quando prevaricam, exercitá-los até que reajam em uníssono perante a sua voz de autoridade. Se um general não admite liderar um batalhão de dois ou três pindéricos, um professor não tem o direito de choramingar quando é honrado com uma turma de trinta soldadinhos para treinar.

Depois, há o facto que tão bem sublinhou e iluminou das mulheres se terem afastado do ensino, por terem torcado esta tão prestigiada e recatada profissão por outras actividades muito menos cor-de-rosa. Sabemos há décadas - desde tempos que já lá vão e que caíram da cadeira -  que lecionar é feminino. Como lidar com esta debandada feminista?!   

Este indecoroso comportamento inclui a cegueira humanitária desta gente que é controlada por um homem de bigode estranho ou por um outro sinistro e esgazeado. Os professores parecem indiferentes aos exemplos dos refugiados que - valha-nos Deus! – são como moscas a assolar a nossa querida Europa fazendo crer que a pobre já está morta e em decomposição. Não vislumbram sequer que as distâncias que estes pobres percorrem são muito superiores àquelas que separam as suas casotas das escolas onde ficam colocados. Não sei se estes migrantes têm casa lá na terra. Penso que vivem naquelas tendas fantásticas, cobertas com tapetes maravilhosos e paisagens de nos tirar a respiração, mas não os vejo a lacrimejar por terem de caminhar alguns desertos até chegar aos seus postos de trabalho.

É compreensível a sua indignação, assim como é lógico que impeça que os nossos impostos sejam atirados aos ventos que são as Escolas Artísticas. Temos a Joana Vasconcelos, temos o José Rodrigues dos Santos, Temos o Pedro Chagas Freitas, temos o José Avillez e até temos a versatilidade do Goucha, mas onde estão os picheleiros? Os torneiros mecânicos, seja lá o que isso for? Os serralheiros? Os serventes dos trolhas e os nossos serventes?! Urge apostar nestas formações básicas e acabar com os pliés os tendus e os frappés. Se queremos ver dançar temos o NY City Ballet. É imprescindível que se trave o acesso das multidões desvairadas ao Ensino Superior e ao Ensino Artístico começando, como muito bem prevê - visionário que é -, a dirigir as crianças mais ranhosas, mais necessitadas e mais subsidiadas - uns sem-abrigo se frequentam as Universidades -, para as formações mais práticas e mais úteis, mesmo aoc pé de casa, que não vampirizam os nossos impostos e que duram dois ou três meses. O Instituto de Emprego e Formação Profissional é pioneiro e tem larga experiência nestas andanças, mas é a um Ministério esclarecido que compete dar envergadura a estas iniciativas que não descuram, de todo, a vertente cultural da aprendizagem.

O ensino do Inglês no primeiro Ciclo é disso exemplo.
Pese embora as tolices dos especialistas que afirmam que aprender a falar e a escrever a língua materna exige uma imensa actividade cerebral e que a exposição simultânea e de teor académico a outra língua interfere de modo negativo no processo de aprendizagem, o meu querido não se deixa enganar e taxa com chumbo quem não torcer o pepino inglês na 4.ª classe. É claríssimo o disparate dos que defendem que o 1.º Ciclo deve apenas ser embalado com os sons da língua inglesa que vagueiam nas cançonetas e lengalengas de Suas Majestades britânicas ou por desenhos, jogos e teatralizações que permitem apreender de forma involuntária e mesmo inconsciente as subtilezas de uma língua estranha. Não nos deixemos enganar! Pagamos os serviços e queremos resultados. Decorar verbos, construções frásicas, frases idiomáticas, vocabulário, a árvore genealógica do rei e as linhas de caminhos-de-ferro que servem o Reino Unido, produz adultos poliglotas, se na escolinha for também servido o mandarim e coisa assim. É certo que já ninguém sabe - e odeia quem o diz -, onde nasce, passa, tropeça e desagua o rio Alfusqueiro ou o rio Fasfião, mas foi uma aventura sujeita a chumbo decorar estas maravilhas portuguesas. Há que recuperar esta produtiva pedagogia, pese agora projecatada nas paredes em sensoriais experiênções de informática inteligência.

Mais lhe teria para dizer, meu querido João, mas se já ninguém atura as aulas interactivas, as provas de aferição informatizadas, as juntas médicas a avaliar cancros mentirosos e o tempo de serviço que é morto de hora em hora, para que serve uma missiva de uma pobre fã dona de um blogue?!

Após vénia mimosa, receba um beijinho da Gaffe.