5.9.23

A Gafe dos muito iguais

Há uma tribo constituída na sua maioria por rapazinhos mais ou menos empertigaitados, muito miméticos, com a capacidade de nos humilhar de fininho com espetadelas de alfinetes miudinhos quando aparecemos todas dispostas a mandar a Chanel para as urtigas.

São como sardinhas pequeninas. Não servem para conservar e são precisas muitas para acompanhar um arroz com tomates.
São rapazinhos doidos por mostrar que a cadeira onde devíamos alapar o rabinho devia chamar-se Le Corbusier e não ter o aspecto miserável das que se chamam Nunes - grande português que vive em Carrazeda de Ansiães e tem bigode farto ,- e  que foram compradas baratas na carpintaria com o mesmo nome.

Gostam de referir as viagens que fazem à Patagónia, apesar do tempo, e mostrar-nos que não dá, de todo, um bom ar esbardanhar o corpinho na areia mais próxima de casa, no pino do Verão.

Gostam de visitar museus e arranjam modo de verificar se a Mona Lisa dava com a chaise-longue que há no hall dos apartamentos pipis que arranjam com o dedo mindinho no ar.

Criticam todas as nossas expressões mais banais e acreditam que a Princesa Diana foi assassinada.

Costumam dizer-nos sem qualquer tipo de pudor que leram Shakespeare aos cinco anos, Tolstoi aos dez e com onze andavam enfronhados em Dostoiévski e, quando se referem à pintura, pasmam-nos declarando que foi aos sete aninhos que descobriram as subtilezas do expressionismo e as nuances todas curvas do barroco. Não percebem que não somos parvas e que reconhecemos que uma criança de cinco anos dedicada a Shakespeare ou à talha dourada dos séculos passados sofre de graves perturbações que num futuro por tratar a transformarão numa psicopata.

São, para espanto meu, quase todos magrinhos e na sua maioria até são girinhos - ou girinos. Usam jeans apertaditos, camisolas de malhinha com decote em V para deixar que se veja a t-shirt branca rentinha ao pescoço, uns ténis aguçados muito D&G e trazem umas pulseiras ranhosas e podres, de tecido colorido, apertadas com um nó que se tem de desfazer para dar sorte.

Raramente andam sozinhos. Arranjam sempre um compincha meio débil e com um QI vagamente numerável que lhes apara o pião e lhes vai dando razão, imitando-o, cameleonicamente, nas farpas, nas fardas e nas opiniões. Dizem umas coisinhas com ar de quem decorou os resumos dos manuais escolares e gostam imenso de arranjos florais.

São pios e vão à missa, mas nunca rezam ajoelhados para não dar azo a ditos maldosos. Não são gays, são, quando muito, gente moderna e solta, sem teias de aranha, nem vestígios de preconceito e podem, eventualmente, dar uma ou outra escapadela com o mecânico que lhes arranja o mini, mas é tudo por uma questão higiénica: já que o rapagão tem a mão na agulheta, pode muito bem desentupir-lhes os canos. Nada de misturar sexo com isto, porque com estes moços, sexo é só entre iguais. E são muito iguais estes rapazes.
Andam a passear a cauda por todo o lado e depois, como quem não quer a coisa, vão informando que são os filhos mais novos de qualquer Direcção.

Frente a um rapazinho filho mais novo de qualquer Direcção que se permite produzir o rebento descrito, logo se percebe que o rapaz tem a mãe entrevada. Há que ter o dobro da paciência e arranjar maneira de o mandar apanhar coisas - ou pilas - sem despertar muita atenção.

Já não se fazem homens como dantes! - diria a minha saudosa Jacinta olhando de soslaio os moldes das molas de rapazes mais peludos.